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O projeto de lei protocolado pelo vereador Marcel Calestini (União Brasil), que propõe a regulamentação municipal de bicicletas elétricas e veículos autopropelidos em Andradina, reacendeu o debate sobre mobilidade urbana e segurança no trânsito. No entanto, a proposta levanta sérias dúvidas quanto à sua legalidade e viabilidade, ao estabelecer medidas que já são tratadas em nível federal pela legislação de trânsito vigente.
A proposta prevê, entre outros pontos, o cadastro, licenciamento e até emplacamento de bicicletas elétricas e equipamentos como patinetes motorizados, além da criação de normas municipais para o uso desses veículos, com possibilidade de apreensão em caso de descumprimento.
Embora o tema mereça atenção diante do crescente uso desses meios de transporte na cidade, especialistas em trânsito e juristas veem com preocupação o conteúdo da proposta, que pode ultrapassar os limites legais da competência municipal.
Desde julho de 2023, a Resolução nº 996 do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) regulamenta nacionalmente o uso de bicicletas elétricas e equipamentos autopropelidos. A norma estabelece critérios técnicos e regras de circulação para veículos com motor elétrico de até 1.000 W, que atingem no máximo 32 km/h quando acionado o pedal assistido. A principal diretriz é clara: esses veículos não necessitam de registro, licenciamento ou placa, nem do condutor possuir habilitação.
Além disso, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), por meio do artigo 134-A, reconhece as especificidades dos veículos de mobilidade individual e permite aos órgãos executivos de trânsito locais apenas regulamentar a circulação em suas vias urbanas, como definir se podem usar ciclovias ou vias compartilhadas com pedestres.
“O município pode e deve disciplinar a circulação, mas não pode criar obrigações como licenciamento, registro ou exigência de emplacamento, pois isso é competência exclusiva da União e regulamentado pelo CONTRAN”, explica o advogado e especialista em trânsito Luiz Fernando Dutra.
O projeto de Calestini impõe obrigações que já são tratadas pela legislação federal, criando risco de inconstitucionalidade e possível judicialização.
Principais pontos de conflito:
Cadastro e Licenciamento Municipal: São práticas típicas de veículos automotores. A exigência desses processos para bicicletas elétricas vai de encontro à Resolução 996/2023, que as isenta dessas obrigações.
Idade mínima e outras restrições: Tais regras devem seguir o padrão nacional. O município pode sugerir campanhas educativas, mas não impor regras punitivas além do previsto federalmente.
Apreensão de veículos: Bicicletas elétricas são consideradas bens de uso pessoal. A apreensão sem previsão legal clara pode ser considerada abuso de poder.
A medida pode afetar diretamente trabalhadores que utilizam bicicletas elétricas como meio de locomoção para o trabalho, entregadores e estudantes.
“A bicicleta elétrica democratiza o transporte e reduz emissões. Inviabilizá-la com burocracia e penalizações injustificadas é um retrocesso”, afirma a urbanista Débora Teixeira, pesquisadora em mobilidade ativa.
Embora não tenha competência para legislar sobre registro e licenciamento, a Prefeitura e a Câmara Municipal de Andradina podem (e devem) atuar para:
Promover educação no trânsito voltada ao uso seguro desses veículos;
Investir em infraestrutura cicloviária e sinalização adequada;
Fiscalizar o uso de equipamentos obrigatórios (campainha, luzes, espelhos, capacete);
Disciplinar a circulação em áreas específicas da cidade, conforme o artigo 24 do CTB.
A intenção de regulamentar o uso de bicicletas elétricas e veículos autopropelidos é legítima e necessária, sobretudo diante do crescimento da mobilidade alternativa nas cidades. No entanto, qualquer proposta legislativa precisa respeitar os limites constitucionais e seguir as normas já estabelecidas pelo Código de Trânsito Brasileiro e pelo CONTRAN.
Transformar um veículo isento de emplacamento em algo passível de apreensão e multa não apenas cria um entrave para a mobilidade urbana, como também desrespeita a legislação federal. O município deve focar em medidas educativas e estruturais, não em punições excessivas.